Gravidez na adolescência


atualizado em 30/05/2004

A taxa de gravidez em mulheres adultas está caindo. Em 1940, a média de filhos por cada mulher era de 6. Essa média, calculada no ano de 2000 caiu para 2,3 filhos para cada mulher.
Porém, o mesmo não acontece com as adolescentes. Segundo os dados do IBGE, desde 1980 o número de adolescentes entre 15 e 19 anos grávidas aumentou 15%. Só para ter idéia do que isso significa, são cerca de 700 mil meninas se tornando mães a cada ano no Brasil. Desse total, 1,3% são partos realizados em garotas de 10 a 14 anos.

Apesar do aborto ser uma prática proibida no Brasil - salvo em alguns casos - mais da metade das adolescentes grávidas da classe média alta, fazem uso dessa prática, quando não podem ou não querem essa gestação (de acordo com os dados da ANDI - Agência de Notícias dos Direitos da Infância - ano 6, nº 277, setembro de 2002).
Isso não quer dizer que as adolescentes pertencentes a uma classe social mais baixa não praticam o aborto. Praticam sim, e pior, utilizam métodos caseiros que uma "amiga" disse que dá certo, objetos pontiagudos para atravessarem o canal do útero, remédios sem indicação médica..., pondo em risco muito maior a sua vida, do que se fosse feito por um profissional qualificado num local adequado para tal procedimento.
 

Já não causa tanto espanto sabermos que meninas de 10, 11, 12 anos tenham vida sexual ativa, assim como aparecem em consultórios portando alguma doença sexualmente transmissível (DSTs) e ou grávida.
O que levaria então essas adolescentes a engravidar? Nunca foi tão divulgado os meios para evitar a gravidez como nos dias atuais, e mesmo assim, o número de adolescentes grávidas á cada vez maior. Existem vários fatores que contribuem com esse quadro:
• Os repetidos casos que aparecem nos consultório de psicólogos e médicos, apontam que muitas dessas adolescentes possuem um desejo de serem mães, da qual elas não tem consciência.
• A falta de um projeto de orientação sexual nas escolas, família, comunidade de bairro, igrejas.
• A mídia é outro vilão nessa questão, exagerando na erotização do corpo feminino.
• Algumas pessoas que são vistas na passarela, revista, cinema e televisão são para os adolescentes verdadeiros ídolos, ídolos esses que passam uma imagem de liberação sexual, e a tendência de um fã é sempre copiar o que seu ídolo faz.
• A falta de informação dos pais de adolescentes é um fator fundamental. Não havendo em casa alguém que possa informá-los, que sirva de modelo, que tire suas dúvidas e angústias, como esperar dos adolescentes comportamentos mais adequados? Como querer que eles aguardem o tempo mais adequado para aproveitar a sexualidade como algo bom, saudável e necessário para o ser humano?

Devido a questões culturais, vergonha, preconceitos, muitos pais tem dificuldade de falar sobre sexualidade com o filho. Na maioria das vezes os recados são dados de forma indireta, e que nem sempre o filho entende. Como por exemplo: "Não vá aprontar"."Olha lá o que vai fazer". Ou usa histórias envolvendo alguma conhecida, como: "viu o que aconteceu com a fulana?". Em muitos casos a orientação sexual dos pais para os filhos, se limita a dizer para as meninas, sobre os cuidados que elas devem tomar com relação à higiene no período menstrual. E para os meninos, dizem: Cuidado para não pegar nenhuma doença.

Nós vivemos hoje numa sociedade onde alguns valores estão invertidos. Por exemplo, num grupo de amigas a questão da virgindade perdeu seus valores (se é que servem para alguma coisa), muito pelo contrário é motivo para gozação das amigas. Por esse motivo, mesmo que ela não esteja com vontade e preparada, passa a adotar um comportamento de procurar um parceiro. Desse modo ela não será mais motivo de gozação no seu grupo. Terá histórias das suas aventuras para contar. Não será mais "careta".

Os adolescentes, além de serem bombardeados pelas transformações fisiológicas e anatômicas, estão envolvidos também seus sentimentos relacionados a essas mudanças. E como ela irá se relacionar com tudo isso? Uma questão fundamental envolvida aqui é a auto-estima e a auto-imagem.
Poder admirar-se, perceber-se como um ser que merece atenção, cuidar-se, assim como se gostar, são ingredientes fundamentais para um desenvolvimento saudável. Mas para isso é necessário ter uma família que o apóie, estimule, e incentive suas atitudes positivas, que deixe fazer, agir sozinho, porém com a segurança de que se precisar de ajuda, terá.
Isso é o ideal. Mas a realidade que se vive é outra. Quantos tiveram ou têm essa chance? A maioria vive de outra maneira. Maneira essa que resulta numa imagem de si pobre e frágil.
Para compensar a falta de valores internos, o adolescente busca valores externos. Como nessa busca o objetivo ideal não é alcançado, daí para as drogas e a gravidez é um pequeno passo.
Muitos adolescentes possuem esse pensamento, que na grande maioria das vezes é inconsciente: "Por que cuidar de um corpo que intimamente não tem valor?" Para que falar de prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e gravidez com meu parceiro se ele pode ficar chateado e me abandonar? Pra que arriscar perder alguém, que eu gosto e que me dá pelo menos um pouco de atenção?
Para amenizar um pouco esses conflitos e angústias é necessário que se valorize os aspectos positivos dele. Qualquer tipo de orientação sexual só dará resultado quando o adolescente sente-se acolhido, valorizado e compreendido, e depois passe a contar com o apoio necessário para tomar atitudes e alterar seus comportamentos.
É nessa fase que as pessoas costumam traçar metas e diretrizes para sua vida. Porém como realizá-las diante de tanta precariedade como a falta de carinho, afeto, compreensão, acesso aos meios de comunicação, lazer, cultura e esporte. Também não passa pela sua cabeça exercer uma profissão que lhe exija o nível universitário, ou mesmo fazer uma viagem que vá adiante de seu Estado. E quando definem o que realmente querem, olha ao seu redor e deparam com todas essas dificuldades. Então, o que fazer? Diante dessa situação muitos lançam mão de algo que possam cuidar, dizer que é seu: Um filho.
Assim ela poderá dar a seu filho o afeto que ela não teve, até mesmo sufocar pelo excesso. Ou quem sabe, não dará, pois não saberá como dar afeto.
Agora com um filho começa uma nova fase. Se já era difícil fazer algo para ela mesma, agora será mais difícil ainda. Como conseguir um emprego para se manter? Como ter acesso ao lazer, esporte e cultura? Sem falar nas atividades que ela terá de se privar pela circunstância do bebê, na qual também é importante para seu desenvolvimento, como sair com as amigas, ir a festas, dançar... pois agora ela tem outras responsabilidades: Cuidar do bebê.
A adolescência, não é o melhor período da vida para engravidar. Grávida a jovem tem que lidar com as tarefas de se tornar independentes, já que tem um dependente sob sua responsabilidade.
Os adolescentes precisam ter condições de descobrir, escolher, traçar seus caminhos. Para uma grávida tudo isso torna muito mais difícil.

Claudecy de Souza
Psicólogo - CRP 06/69861